corpo era limitado por uma doença degenerativa desde o início da idade adulta, mas a mente do gênio Stephen Hawking, morto na semana passada aos 76 anos, continuou ativa até o fim da vida. No último dia 4, menos de duas semanas antes de falecer, o físico britânico apresentou ao mundo sua última contribuição científica. No artigo “A Smooth Exit from Eternal Inflation”, Hawking, com o colega Thomas Hertog, da Universidade Leuven, traçou a matemática fundamental que limita a existência de possíveis universos paralelos.
O artigo foi publicado na plataforma arXiv — mantida pela Universidade Cornell para estudos ainda não revisados pela comunidade científica — ano passado, mas atualizado no dia 4 de março. A teoria do multiverso, conhecida popularmente por séries de ficção científica, prevê a existência de universos paralelos. O artigo de Hawking e Hertog define o escopo teórico para que uma espaçonave encontra evidências sobre o multiverso.
Para Hertog, caso tal evidência fosse encontrada durante a vida, Hawking seria um forte candidato ao Prêmio Nobel, que o físico britânico almejou por tanto tempo, mas nunca recebeu. “Este era o Stephen: ir de forma destemida onde ‘Star Trek’ não se arriscava”, disse Hertog, ao Sunday Times. “Ele era sempre indicado ao Nobel e deveria ter recebido. Agora, não poderá mais.”
Em seu último trabalho, Hawking confrontou uma questão que o intrigava desde 1983, quando descreveu, ao lado de James Hartle, como o universo surgiu com o Big Bang. Segundo esta teoria, o nosso universo expandiu — e continua expandindo — de um pequeno ponto no espaço, num processo conhecido como inflação. O problema é que esta tese prevê que o nosso Big Bang foi acompanhado por infinitos outros, cada um produzindo um universo diferente.
Este paradoxo matemático tornou a teoria impossível de ser testada, já que o único universo onde podemos realizar experimentos é o nosso. Há 15 dias, Hertog se encontrou com Hawking para a revisão final do artigo, que está sob análise para ser publicado num renomado periódico científico, segundo o Sunday Times. “Nós queríamos transformar a ideia do multiverso num quadro científico testável”, explicou Hertog.
Neil Turok, diretor do Perimeter Institute, no Canadá, discorda da tese de Hawking. “O que me intriga é por que ele achou esta visão interessante”, avaliou.
Já Carlos Frenk, professor de Cosmologia na Universidade Durham, considera que o último trabalho de Hawking pode preencher uma lacuna na história da evolução do universo.
“A ideia intrigante no artigo de Hawking é que o multiverso deixa marcas na radiação que permeia o nosso universo e nós podemos medi-las com um sensor numa espaçonave”, comentou Frenk. “Essas ideias oferecem a possibilidade de se encontrar evidências para a existência de outros universos. Isso poderia mudar profundamente nossa percepção sobre o nosso lugar no cosmos.”
Mas a teoria final de Hawking oferece uma visão trágica sobre o nosso futuro. Ela prevê que o destino do nosso universos é simplesmente desaparecer, assim como as estrelas se apagam com o fim da energia.