Uma das principais apostas do presidente Michel Temer, agora efetivado no cargo, é promover a retomada dos investimentos e colocar o país novamente na trilha do crescimento. Essa retomada passa, sem dúvida, pelo novo programa de desestatização por meio de concessões e parceiras público-privadas (PPPs).
Mas, para que isso se torne realidade, existem quatro ingredientes que compõem esta “receita do bolo” e que precisam ser muito bem dosados, do contrário, a iniciativa, manifestada na Medida Provisória 727, poderá não sair do forno. São eles: modelagem jurídica, financiamento, mitigação de riscos e garantias, este último, tanto do público para o privado e vice-versa.
Nos últimos meses, temos lido e ouvido com frequência informações que tratam da elevação das garantias nas contratações públicas previstas nos artigos 31 e 56 da Lei 8666/93. Notícias destacam a necessidade de revisão do modelo atual das garantias, algumas comparações sobre outros países e muitas delas colocam o seguro garantia em posição de destaque como peça fundamental de um grande quebra-cabeça. Outras, equivocadas, procuram transformar o seguro garantia como um verdadeiro “antidoto” contra a corrupção desvendada pela operação Lava jato.
A realização da audiência pública na última semana no Senado Federal para debater o capítulo que trata das garantias no Projeto de Lei 559, e em especial a aplicação do seguro garantia, evidenciou este debate, e proporcionou a todas entidades ali representadas oportunidade para manifestar seu ponto de vista, todos convergentes para necessidade da modernização da lei de licitações.
Faltou, no entanto, esclarecer com maior profundidade a forma de utilização do seguro garantia, sem o qual este produto pode ser inviabilizado, ou sua eficácia pode ficar prejudicada, na medida em que alguns técnicos e legisladores que estão redimensionando sua aplicação parecem desconhecer os fundamentos técnicos e jurídicos deste produto que existe no Brasil e no exterior há vários anos.
A principal finalidade do seguro garantia é cobrir o sobrecusto, ou seja, o valor adicional necessário para substituição do contratado inadimplente por outra empresa, que deverá ser chamada para concluir a obra ou dar continuidade na prestação do serviço objeto da licitação.
De acordo com a Lei 8.666/93, esta substituição não pode ser feita por terceiros, no caso a seguradora, restando ao administrador público convocar o segundo colocado para concluir a obra pelo mesmo valor do primeiro colocado, ou refazer a licitação. Caso o edital tenha previsto uma das modalidades de garantias admitidas no artigo 56 da referida lei (caução em dinheiro, fiança bancaria, títulos da dívida pública ou seguro garantia), o administrador público poderá valer-se deste recurso para amenizar os prejuízos com a nova contratação, lembrando que, caso o licitante tenha optado pelo seguro garantia, o segurador poderá atuar como uma espécie de “mediador”. Com isso, o segurador tentará equacionar os problemas do contrato garantido, do contrário, restará pagar ao segurado (administração pública) a indenização prevista na apólice de seguros.
Esta é uma das principais discussões presente no Projeto de Lei do Senado 559: modificar a legislação vigente para permitir ao segurador intervir no contrato e concluir a obra, arcando com o sobrecusto apurado, até o valor da garantia estipulado na apólice, sem assumir riscos do passado e evitando a necessidade de uma nova licitação.
Esta tese, também defendida pelo mercado segurador e ressegurador, demonstra que não há razoabilidade em estipular garantias de execução (performance bond) superiores a 30% do valor do contrato de obras e serviços públicos, haja visto que este percentual, adicionado ao saldo do preço ainda não executado e, portanto, disponível para pagamento ao novo contratado, seria mais do que suficiente para conclusão da obra ou fornecimento do serviço.
Outro ponto importante é a tese da obrigatoriedade de garantias nas licitações públicas, independentemente de sua forma e conteúdo. A obrigatoriedade de prestação de garantias proporcionará substancial segurança jurídica nas contratações públicas. Vale lembrar que a legislação atual admite licitação de obras e serviços sem qualquer tipo de garantia, fato este que contribui para o aumento de obras inacabadas. Essa é uma realidade em muitos Estados e municípios brasileiros.
Apesar de a discussão envolvendo ampliação das garantias ainda não ter alcançado o ambiente das concessões comuns, administrativas e patrocinadas, é certo que em breve enfrentaremos este debate.
Não resta dúvida de que o seguro garantia será o principal instrumento de desenvolvimento da infraestrutura no país. Mas deve ser utilizado dentro dos princípios legais e de mercado, evitando, assim, o surgimento de efeitos colaterais indesejados, tais como: concentração de mercado, aumento de custos nas contratações públicas e desinteresse dos seguradores e resseguradores em operar com esta modalidade de seguros.
Por André Dabus é Diretor executivo da AD Corretora de Seguros, advogado, corretor de seguros e consultor especial da GO Associados.- Carvalho Assessoria
Blog do Florisvaldo – Informação Com Imparcialidade – 15 /09/2016