Quatro presidentes de seguradoras falam sobre como estão conduzindo as operações em tempos de pandemia
A recomendação é permanecer em casa, de onde a vida e o trabalho são conduzidos. Os profissionais do mercado de seguros têm trabalhado intensamente para minimizar os impactos da pandemia e manter as operações, enquanto o ‘novo normal’ já começa a ser pensado.
As quatro companhias já possuíam a cultura do home office, porém nada é parecido com o que vivemos. A experiência é individual, mas há consensos entre os quatro presidentes. A tecnologia é aliada, mas não supre o contato pessoal.
À frente da Porto Seguro, Roberto Santos permanece em sua casa com uma rotina diferente da que está acostumado. Por isso, chama a atenção para a necessidade de fazer alguns ajustes e procurar manter a disciplina.
“Para manter o clima, coloco até o meu crachá da Porto Seguro. Nas reuniões, visto camisa, jeans e sapato confortável, mas em alguns dias adoto o ‘Bermuday’. Na minha agenda, mantenho o horário de início às 8h, mas acordo antes, faço exercício físico, tomo o café, leio jornais e me programo”.
Santos começa as atividades às 8h e por volta de 13h é a pausa para o almoço, com a família. “Isso dificilmente deixamos de fazer. Essa é outra regra importante. Estamos todos na quarentena. Então, são valiosos esses momentos juntos. A saúde mental é tão importante quanto a física”.
À noite, após o trabalho, ele se concentra em uma atividade mais prazerosa, de lazer ou cultural – um filme, uma série, um documentário ou estudar algo. “Aqui em casa (eu, minha esposa e minha filha) estabelecemos que às sextas- feiras, nos arrumamos como se fôssemos jantar fora. Pedimos comida e abrimos um vinho. No final de semana, procuramos fazer alguns happy hours com amigos remotamente”.
Para ele, esses momentos são valiosos. Por isso, recomenda cuidado para os finais de semana não serem transformados em dias normais de trabalho, devido ao envolvimento com a rotina.
Na visão de Santos, as reuniões têm sido mais produtivas e assertivas. “Como não temos o tempo de deslocamento casa – empresa – casa, substituímos este tempo por trabalho. Sem sombra de dúvidas estamos trabalhando mais do que na empresa”.
Na Porto Seguro mais de 3 mil funcionários já atuavam em home office integral antes da pandemia. Agora são 95% de todos os funcionários trabalhando em home office integral. “A principal questão seria como embarcar a tecnologia para que a operação funcionasse exatamente da mesma maneira. E conseguimos. Não tivemos problemas para essa implementação devido aos investimentos que fizemos em tecnologia nos últimos anos”.
A companhia criou um Comitê de Crise (com pessoas de várias áreas), que atua como o ponto focal da comunicação (interna e externa). “Todas às sextas temos um comunicado oficial, que circula para toda a companhia, sobre a saúde da empresa e o que estamos fazendo para manter as coisas em ordem. A ideia é mostrar que seguimos atuando normalmente, apesar dessa nova rotina”.
Em se tratando dos corretores, há uma comunicação específica para falar com eles – como sempre foi feito.
“Para mim, o maior desafio ainda é relacionado ao contato com as pessoas. Tenho um perfil de estar próximo, de ouvir as pessoas, passar nos andares, nas mesas, olhar nos olhos e conversar ‘olho no olho’, assim conseguimos sentir se a pessoa está bem. Neste sentido, o ambiente digital ainda não consegue ajudar muito”.
“Como minha filha casou há seis anos e minha sogra não está nos visitando em função da quarentena, me apossei do quarto e o transformei no meu escritório”, conta José Adalberto Ferrara, presidente da Tokio Marine.
O tempo que ele deixou de gastar no trânsito está sendo utilizado nas caminhadas. Após o dia de trabalho, por volta das 20 horas, sai para caminhar pelo bairro. “Usando máscara e álcool em gel no bolso. Usualmente nesse horário, eu estaria saindo da Tokio Marine e chegaria em casa umas 21 horas, sem vontade de fazer nada!”.
Para ele, no início houve o estranhamento ao home office total. Agora, já há uma adaptação melhor ao trabalho remoto, com a consolidação de rotinas pelos gestores e suas equipes.
Segundo Ferrara, a Tokio Marine já tinha o home office como uma prática parcial e o grande desafio foi colocar todos trabalhando em casa, simultaneamente. Após a tomada de decisão da Diretoria Executiva pela implementação do Plano de Continuidade de Negócios (PCN), todo o processo durou cerca de uma semana, de forma bastante rápida e organizada.
“Diante do anúncio da Organização Mundial de Saúde (OMS) da pandemia de covid-19, nós tínhamos dois imensos desafios: preservar a saúde de todo o nosso time de colaboradores, hoje cerca de 2,3 mil pessoas, incluindo os terceiros; e manter a integralidade da operação”.
Graças à sólida infraestrutura de tecnologia e ao enorme espírito de cooperação de toda a equipe, a companhia tem mantido os índices de produção e a qualidade da prestação de serviços aos corretores, assessorias e clientes.
“Os grandes desafios de gerir a companhia de forma remota são transmitir tranquilidade a todos os colaboradores, informando-os regularmente sobre o andamento das operações, e ao mesmo tempo, fazer com que todos mantenham o foco na entrega de suas atividades. É natural que haja uma sensação de dúvida quanto ao futuro, e estamos trabalhando diretamente com os Gestores para acalmar e incentivar seus times. Para isso, a comunicação frequente é fundamental e é isso que temos estimulado e promovido”.
Ferrara diz sentir muita falta do dia a dia na companhia, do contato direto, com os colaboradores, e com os parceiros de negócios. “Apesar de ser um momento delicado, todos nós temos tido a oportunidade de nos reinventar, de repensar e adaptar nossa visão de negócio, criando novas oportunidades em termos de Produtos e Serviços e, assim, atendermos cada vez melhor nossos segurados. Nosso mercado já passou por inúmeras crises e dessa vez não será diferente. Tenho plena confiança de que sairemos mais fortes dessa situação!”
Carlos Magnarelli, CEO da Liberty Seguros, também optou em permanecer em São Paulo durante a quarentena. “É muito importante para mim estar presente, perto da operação. O escritório aqui de casa se tornou a minha sala da Liberty fora da companhia”.
No início, ele achava que, por estar de home office, poderia se dedicar a outras atividades, como ler livros, assistir filmes ou treinar em sua bicicleta fixa. “Entretanto, para cumprir o nosso valor de colocar as pessoas em primeiro lugar e fazer todas mudanças necessárias para a segurança e bem-estar dos nossos públicos, a companhia entrou em estado de emergência e nossas agendas foram tomadas por reuniões que acabaram trazendo uma carga maior do que já tínhamos”.
As exigências mudaram e as jornadas acabam sendo mais longas. “Sou muito grato por ter uma família que compreende que estamos passando por um momento muito crítico e que manter o foco e entregar sempre o melhor é indispensável”.
Magnarelli destaca que, por outro lado, é muito bom estar perto da família todos os dias. “Nós passamos mais tempo juntos e conseguimos fazer coisas que antes não eram possíveis, como almoçar e jantar juntos, por conta das minhas viagens, compromissos e a distância entre a Liberty e a minha residência”.
Na Liberty, os colaboradores já tinham a opção de trabalhar de home office alguns dias por semana, além de ter horários flexíveis e implementar jornadas mais curtas às sextas-feiras, quando o expediente vai até as 14 horas.
Segundo Magnarelli, o principal desafio foi manter todos os colaboradores em segurança, o que foi possível devido à flexibilidade dos sistemas. O segundo foi manter todos os departamentos rodando normalmente, desde a área de vendas até a área de sinistros, departamentos de operação, financeiro, tecnologia, produtos, recursos humanos, etc. “Além disso, outro ponto de atenção foram as novas necessidades dos corretores e clientes e a adaptação do nosso trabalho para atender à nova realidade. Tivemos que fazer tudo isso acontecer de uma forma nova, lidando com a adaptação a este novo estilo de trabalho, ainda mais para mim, que não tinha costume de home office”.
Manter todos os públicos bem informados do cenário e das mudanças para atender às necessidades também foi uma preocupação. “As primeiras semanas foram decisivas e fizemos diversas melhorias em nossos processos para facilitar o dia a dia dos nossos clientes e corretores”.
Durante a quarentena, ele diz sentir falta de ir ao escritório e das reuniões presenciais com os colaboradores. “Ver alguém por vídeo não é o mesmo do que pessoalmente e eu gosto desse contato interpessoal. Me conformo pensando que em breve voltaremos ao normal, talvez um ‘novo normal’, mas imagino que conseguiremos resgatar o melhor do mundo virtual e do mundo presencial, unindo-os para que as pessoas possam sempre contar com a Liberty”.
O CEO da Zurich, Edson Franco, conduz as operações da companhia de sua casa em São Paulo, onde mantém a rotina diária de trabalho junto às demais lideranças da companhia.
As reuniões são virtuais e a agenda permaneceu quase inalterada. A exceção são as reuniões extras do gabinete de gestão de crise e dos grupos de trabalho criados especificamente para enfrentar a situação inédita.
“Estamos todos nos adaptando. Sinto que estou trabalhando mais. São muitas reuniões virtuais e demandas de toda ordem. Este é um momento que exige grande atenção de todos nós. De fato, estou completamente absorvido e focado”.
Segundo Franco, a diferença é que não há perda de tempo com deslocamentos e dispersões que são naturais na rotina do escritório. “Procuro ser disciplinado para criar os espaços de trabalho e de lazer e não deixar um invadir o outro, na medida do possível. Mas isso é algo que já buscava mesmo antes da intensificação do trabalho remoto. Estamos todos descobrindo uma nova maneira de trabalhar”.
Na rotina, outras atividades foram inseridas. “Procuro desfrutar da facilidade de estar mais próximo da minha esposa no dia a dia. Estou lendo mais e cozinhando mais também que é algo que gosto de fazer”.
Para ele, o período de pandemia ressalta o papel fundamental no mercado de seguros e, em tempos de crise, a atuação consultiva é ainda mais importante para os clientes.
“Nosso objetivo é manter o nível normal de funcionamento dos negócios e oferecer suporte de alto nível para corretores e clientes. Naturalmente, há uma desaceleração por conta dos impactos econômicos e das medidas de quarentena e distanciamento social, mas a crise nos dá a oportunidade de sermos melhores, mais eficientes e tirar proveito das soluções digitais”, diz o CEO ao lembrar que a companhia também desenvolveu uma série de serviços e facilidades para ajudar os parceiros.
“Por mais que a tecnologia nos permita seguir trabalhando intensamente, o contato pessoal é insuperável. Sinto falta deste contato diário, do debate próximo, do convívio. Mas sabemos que esta crise acabará e teremos em breve a oportunidade de retomar esta parte prazerosa de nossas rotinas”.
Sobre o fato de enfrentarmos uma crise inédita, ele cita que os desafios são vários e simultâneos: garantir a segurança dos funcionários; manter os níveis de serviço aos clientes e corretores; assegurar a continuidade das operações; criar alternativas para superar os entraves de uma economia praticamente paralisada e pensar nos cenários possíveis para o momento da volta à normalidade.
“Dar conta desta demanda exige ter um time muito afinado, com responsabilidades muito bem definidas e objetivos claros. Estamos nos saindo muito bem. Temos um grupo muito coeso, diretrizes muito bem definidas e planos de gestão de crise muito bem estruturados. Vamos sair desta pandemia fortalecidos e com uma cultura colaborativa renovada”.
Fonte: Revista Cobertura – Edição de maio número 220 – Carol Rodrigues
Blog do Florisvaldo – Informação Com Imparcialidade – 19/06/2020