Nipo-brasileiros que moram no DF falam sobre respeito e amor às raízes – Pai do Waldemar Hiroshi Umeda (primeiro à esquerda) durante travessia Japão-Brasil, em 1932 – Foto: Waldemar Hiroshi Umeda/Arquivo pessoal – Data é celebrada nesta sexta-feira (18). Conheça Takashi Yamanishi, 27 anos, que aos 10 ‘descobriu’ que era brasileiro: ‘Meu mundo caiu’, diz. Já servidor público de 70 anos reconta chegada de familiares ao Brasil.
O orgulho de ser brasileiro e, ao mesmo tempo, o amor e respeito pelas raízes são parte da formação das identidades de dois nipo-brasileiros – descendentes de japoneses – que moram no Distrito Federal. Apesar da diferença de 43 anos entre eles, em comum, carregam os valores e traços culturais do Japão, mas a nacionalidade e o endereço do Brasil.
Nos primeiros anos da infância, o jovem sansei Takashi Yamanishi – neto de japoneses, hoje, com 27 anos – achava que era japonês e, não, brasileiro. Por causa disso, precisou aprender a criar vínculos com o país latino. Já o servidor público Waldemar Hiroshi Umeda, de 70 anos, cresceu sabendo que era filho de imigrantes e que precisava honrar o nome da família na terra estrangeira.
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Takashi e Waldemar fazem parte dos mais de dois milhões de japoneses e descendentes que vivem no Brasil. Esse número é uma estimativa feita pela Embaixada do Japão no país. A representação reconhece no país “a maior comunidade nikkei (nome dado aos descendentes e japoneses que moram no exterior) fora do país asiático”.
No aniversário de 113 anos do Dia da Imigração Japonesa, celebrado nesta sexta-feira (18), o G1 conta a história de descobertas na vida desses dois nipo-brasileiros. A data marca a chegada do navio Kasato-Maru que, em 1908, atracou na costa brasileira trazendo a bordo os primeiros imigrantes japoneses para trabalhar nas lavouras do país.
‘Fabricado’ no Japão
Takashi Yamanishi, 27 anos, é estudante de biologia na Universidade de Brasília (UnB) e faz parte da terceira geração de descendentes japoneses. O pai e a mãe dele – ambos filhos de imigrantes – mantiveram presente, na criação do filho, o idioma, a cultura e a culinária do Japão.
O jovem nasceu no Japão. A família estava no continente asiático para que o pai, brasileiro, concluísse o doutorado. Foi quando a mãe de Takashi engravidou. “Vim para cá [Brasil] quando era bem bebê. Só fui fabricado lá”, brinca o jovem.
Como nenhum dos pais tinha a nacionalidade japonesa, o recém-nascido foi registrado como brasileiro. Apesar disso, ele lembra que até os cinco anos falava apenas a língua da terra natal dos avós. A imersão na cultura japonesa era tão grande que Takashi achou que era japonês e não brasileiro.
“Até que o meu mundo caiu quando recebi o RG aos 10 anos.”
“Era lógico pensar que era japonês. Eu não falava o português tão bem. Só comia comida japonesa, inclusive arroz e feijão não fazem parte da minha rotina. Em relação à cultura e em termos de disciplina, de como se comportar, era voltada para o lado japonês”, explica.
Nipo-brasileiro
Na hora de “reconstruir o mundo”, Takashi inseriu a identidade brasileira como parte dessa estrutura. O português ganhou espaço no dia a dia e até mesmo o famoso “jeito amigável” característico de quem mora no Brasil passou a fazer parte da personalidade do jovem.
“Fui entendendo melhor sobre a minha identidade japonesa. Vi que era nipo-brasileiro, ou seja, brasileiro com ascendência japonesa, que é uma das identidades que compõem o que eu sou: um lado japonês e outro brasileiro.”
Já adulto, Takashi trabalhou por alguns anos como professor voluntário em cursinhos gratuitos e, graças à experiência, descobriu a vocação para ser educador. Como forma de unir a cultura e o amor pela sala de aula, o jovem passou a ensinar japonês em uma escola de idiomas de Brasília.
Na trajetória, acumula ainda a experiência no cargo de presidente da Associação Brasiliense de Ex-Bolsistas Brasil-Japão (ABRAEX), de 2017 a 2020, e mais duas viagens ao Japão relacionadas ao trabalho no ensino do idioma e da cultura japonesa.
Segundo Takashi, a visita ao país asiático mostrou que, mesmo conhecendo bem as raízes, se “sentia um estrangeiro lá”.
“Apesar de falar o idioma e entender a cultura, eu tinha umas questões que era fundamentalmente diferentes, como o modo de me comportar. Somos mais amigáveis aqui no Brasil. Lá, a sociedade é mais rigorosa, não tem tanto contato social, e a gente sente uma barreira cultural quando estamos com eles”, disse.
Imigração japonesa
Outro morador do DF que também já visitou o Japão é o servidor público Waldemar Hiroshi Umeda, de 70 anos. Ele conta ao G1 que quando esteve no país asiático, relembrou de todas as histórias que ouviu a respeito da imigração dos pais para o Brasil, em 1932.
Após 58 dias de viagem, um navio vindo do Japão atracou no porto de Santos (SP) trazendo seis membros da família Umeda, em busca de uma vida mais próspera no país da América Latina. Após a chegada, o governo local mandou os imigrantes para uma cidade no interior de São Paulo, onde recomeçaram a vida.
No Brasil, o pai de Waldemar conheceu outra imigrante japonesa com quem se casou e teve sete filhos. A família vivia da agricultura até que o pai do servidor público faliu, por causa de uma seca que atingiu a região. O novo destino dos nikkeis foi Brasília. Eles chegaram na capital federal em 1971.
Waldemar Hiroshi Umeda (ao centro), familiares e amigos ao receber comenda ‘Ordem do Sol Nascente, Raios de Ouro e de Prata’ – Foto: Embaixada do Japão/DivulgaçãoSegundo Waldemar, a partir daquele momento “cada um dos filhos dos imigrantes seguiu seu destino”. Na época, o brasiliense tinha 20 anos, e a decisão dele foi ingressar na UnB e, depois, iniciar a carreira como servidor público.
“Ele [o pai] e minha mãe não retornaram ao Japão. Ambos falavam muito das origens deles, mas sempre lembravam que o Brasil é um país próspero. Ele [meu pai] dizia: ‘Filho, você não pode esquecer que é descendente de japonês, mesmo sendo cidadão brasileiro. Trabalhe no Brasil sem esquecer das raízes”, relembra.
Nome da família
O servidor público conta que, ainda hoje, lembra dos conselhos do pai, que costumava falar sobre a importância de preservar o nome da família. “Dizia sempre: ‘procure honrar o sobrenome Umeda, porque se você fizer qualquer bobagem estará sujando o nome também dos seus antepassados’ “.
Considerando os conselhos, em paralelo às obrigações do trabalho, Waldemar conciliava a rotina com a vivência da cultura da japonesa, o que resultou em quase 20 anos como membro da Associação Cultural Esportiva e Recreativa Nipo-Brasileira do Distrito Federal — Nikkey.
Foram tantos anos de dedicação e atividades para promover um intercâmbio entre Brasil e Japão que, em 2019, o morador do DF recebeu a comenda “Ordem do Sol Nascente, Raios de Ouro e de Prata”. O título foi dado em reconhecimento pela liderança na comunidade nipo-brasileira em Brasília ao longo dos anos.
“Quando recebi a comenda, eu agradeci muito ao meu pai. Eu senti que ele cumpriu a missão de orientar os filhos”, afirma. Para o nikkei do DF, ser nipo-brasileiro é uma mistura entre o “orgulho de ser brasileiro e de ser descendente de japoneses”.
Fonte: https://g1.globo.com
Blog do Florisvaldo – Informação Com Imparcialidade – 18/06/2021