Nas várias ocasiões em que as minhas crônicas trataram das Instituições que integram a estrutura maior da República, sempre abordei com muita ênfase a necessidade de observância dos princípios de independência entre os Poderes. Isso não significa ações isoladas e absolutistas desse ou daquele Poder, mas uma convivência de respeito mútuo e sincronizada pelo bem da Nação brasileira. Esse deve ser o ponto de partida em qualquer democracia!
Há um tom de leve vulnerabilidade que separa — e às vezes confunde — os três pilares que hoje definem o destino político do Brasil: a TOGA (a Justiça), o PALANQUE (Legislativo e Executivo) e o VOTO (o Povo). Cada um deles, em tese, deveria ocupar um território distinto no mapa democrático. A Toga, guardiã da lei e da Carta Magna do País; o Palanque, espaço do debate e da disputa de ideias; o Voto, expressão soberana do Povo. Mas, na prática, essas fronteiras tornaram-se de caráter quase imperceptível, como se o país vivesse um permanente estado de confusão entre o que julga, o que fala e o que escolhe.
O que se tem visto nos últimos anos, é que a política brasileira se converteu num palco de sobreposições. O Judiciário assumiu um protagonismo impensável, não apenas como árbitro, mas muitas vezes como ator central. O STF sempre conhecido como o Supremo legalmente composto por 11 Ministros, está numa fase em que virou rotina as decisões por determinados Relatores que tudo resolvem, monocraticamente! Num colegiado, o que mais se espera e se entende, é que todos tenham sempre a sua liberdade de expressar o seu entendimento.
O Executivo, por sua vez, transformou o discurso político em um território de retórica populista, onde promessas e narrativas se confundem na mesma fala. E o Legislativo, em meio às tradicionais negociações, emendas parlamentares lucrativas e coalizões frágeis, tenta manter o equilíbrio político e a sobrevivência prática, cuja moeda de troca cega completamente aquele que foi colocado lá, para defender o voto recebido!
Situado entre esses polos, está o eleitor descrente e cheio de expectativa, que tudo observa na esperança de que o seu voto possa vir a produzir alguma mudança. Já não confia plenamente em nenhum dos lados, mas também não se permite desistir, porque sabe que o seu voto, ainda que simbolicamente, faz parte da engrenagem. O problema é que o voto, sozinho, tem sido cada vez menos suficiente para alterar o curso das coisas.
Diante desse universo robustecido de dúvidas e incertezas, torna-se impositivo estimular um processo de reconstrução da linha de confiança perdida, entre quem decide, quem executa e quem julga. Sem ela, a democracia se torna apenas um ritual praticado por uma toga que brilha sob os holofotes, um palanque que ecoa palavras vazias, e um voto que, embora legítimo, parece não encontrar destino. Está evidente a existência de um desequilíbrio institucional que marca o cenário político do Brasil contemporâneo. Essa realidade está a olhos vistos, em todas as eleições nos números divulgados de votos nulos, brancos e abstenções.
Essa é a triste realidade que atormenta o Brasil dos nossos dias, cujo dilema nacional é estimulado pelo fato de que os nossos líderes estão mais voltados a enxergar e opinar sobre os problemas internacionais e menos envolvimento com os problemas internos. Inclusive, essa falta com o país já passa da hora de ser corrigida, porque está ficando feio!
Enquanto a toga, o palanque e o voto não reencontrarem seus lugares legítimos, o Brasil continuará vivendo esse perigoso entrelaçamento de poderes e desconfianças. É preciso que a Nação recupere a consciência quanto à responsabilidade sobre o próprio destino.
Autor: Adm. Agenor Santos, Pós-Graduação Lato Sensu em Controle, Monitoramento e Avaliação no Setor Público – Salvador – BA.
Blog do Florisvaldo – Informação Com Imparcialidade

2 Comentários
UM ARTIGO PERTINENTE E OPORTUNO FAZENDO UMA ANÁLISE SOBRE ESSA SITUAÇÃO CONFUSA QUE EXISTE HOJE NO PAÍS., TUDO BEM RESUMIDO E BEM DITO NO SEU ÚLTIMO PARÁGRAFO.
Agenor, parabenizo pela clareza, profundidade e equilíbrio com que desenvolve o tema “A Toga, o Palanque e o Voto”. Sua análise traduz, com rara lucidez, o delicado entrelaçamento entre os Poderes da República e o papel decisivo do cidadão nesse contexto.
A forma como o você aborda e distingue – sem perder a unidade – os três pilares da democracia, demonstra não apenas sensibilidade cívica, mas também sólida compreensão da dinâmica institucional brasileira. É uma reflexão oportuna e necessária, que convida à autocrítica, à responsabilidade e ao resgate da confiança entre quem julga, quem executa e quem vota.
Meus cumprimentos pela excelência do texto e pela coragem de tratar com serenidade e profundidade um tema tão atual quanto desafiador.