Sempre que me permito uma breve releitura de crônicas passadas, chego à triste constatação do quanto é lento o processo das mudanças necessárias e fundamentais, tão reclamadas em pontos importantes das regras que regem e disciplinam o funcionamento dos diversos setores do Sistema Institucional, e em particular o Poder Judiciário. E o que mais me impressiona é a convicção e coerência do pensamento dos leitores, expresso em comentários contundentes e que identificam a revolta e o protesto da própria sociedade.
Assim, dentre tantos ajustes reclamados nas Reformas pleiteadas, há uma prática indesejável e que teima em permanecer vigente e sem qualquer expectativa de mudança por parte dos legisladores brasileiros: o processo superado de escolha e nomeação dos Ministros do Supremo Tribunal Federal-STF.
Chegou à proporção alarmante o nível de desgaste do STF na avaliação do povo brasileiro, ferindo no cerne o histórico conceito de respeito e reverência desfrutados pelos seus membros. Atualmente, é preocupante um Magistrado do Tribunal pretender ir a um restaurante com a família, estar em viagens aéreas ou mesmo usando do salutar direito de passeios turísticos nacionais e internacionais, sem correr o risco de desagradáveis protestos e agressões verbais. Diga-se de passagem, práticas com as quais discordamos, porque existem outras formas civilizadas de manifestar a divergência.
Foram vítimas desses assédios: no Aeroporto de Roma, o Ministro Alexandre Moraes, e já aconteceu em várias ocasiões; o Ministro Gilmar Mendes já foi hostilizado muitas vezes por imigrantes brasileiros em Lisboa, para onde viaja, periodicamente; no Litoral Norte catarinense, os seguranças precisaram acompanhar a saída do Ministro Luís Roberto Barroso, atual Presidente do Supremo, que precisou interromper o jantar com amigos, e saiu escoltado na noite do 03/11/22, ao ser vaiado por bolsonaristas.
De outro lado, como se esperar dos Senhores Ministros eleitos uma postura e julgamentos independentes, se cada um foi escolhido pelo Presidente da República para posterior sabatina e aprovação na Comissão de Constituição e Justiça (CCJ) do Senado Federal e, em seguida, submetido ao voto da maioria absoluta do Plenário do próprio Senado? Podemos chamar isto de cartas marcadas? Talvez mais que isso: cartas mandadas, venha a calhar melhor!
Mesmo que não seja da índole do magistrado escolhido, a parcialidade e o princípio da gratidão estarão inevitavelmente presentes e interferindo sempre nas suas ações de julgamento, seja conscientemente, ou inconscientemente. É um absurdo primário que isso aconteça envolvendo a escolha de possíveis futuros membros do STF, e que o mérito da competência profissional não seja a prioridade.
É um fato já recorrente, que antes dos julgamentos de processos importantes no Tribunal, até mesmo as pessoas comuns antecipam os prováveis resultados, contando os votos com base nas possíveis conexões partidárias dos votantes! A curiosidade é identificar qual a tradição política ou qual partido indicou esse ou aquele Ministro! Deprimente! Inadmissível! Que coisa questionável!
Na crônica publicada em fevereiro de 2017, seis anos atrás, sob o título “UM PODER ALVO DE OUTRO PODER”, reportei o seguinte:
“Existem, como prática comum em vários países, três modelos distintos de preenchimento de vagas de magistrados nas Cortes Supremas, mais conhecidos como: a) Sistema Cooperativo: O Presidente indica um nome, mas depende de outro Poder, no caso o Senado Federal, para sabatinar e aprovar ou rejeitar o candidato, forma vigente no Brasil, Estados Unidos e Argentina; b) Sistema Representativo: As vagas são distribuídas, harmonicamente ou não, entre os Poderes Executivo, Legislativo e Judiciário, sem possibilidade de rejeição de qualquer parte, a exemplo de França, Itália, Turquia e Noruega; c) Sistema Profissional: Esse modelo prioriza os conhecimentos técnicos e a formação jurídica do candidato, o qual é indicado pelos membros da própria Corte, configurando um elevado grau de distanciamento das influências políticas e partidárias, principalmente”. A forma ideal…
Sendo o STF a mais alta Corte Jurídica deste país, guardião maior na defesa da nossa Constituição Federal, a preservação da integridade e do respeito à Corte, deveria começar por critérios mais idôneos e independentes na escolha dos seus Magistrados, e nunca a depender do dedo político definindo os nomes dos seus Ministros.
Esses constantes bate bocas entre a Presidência da República e o Supremo Tribunal e, em particular, com alguns Ministros não identificados politicamente, é um vexame aviltante e que envergonha o povo brasileiro.
Espero, num breve futuro, poder aqui retornar para exaltar a atitude dos nossos legisladores que, após profundo e detalhado estudo técnico-jurídico tenham decidido alterar as regras de composição desse importante Tribunal Federal, livrando essa Alta Côrte de determinadas canetadas da Presidência da República.
Autor: Adm. Agenor Santos, Pós-Graduação Lato Sensu em Controle, Monitoramento e Avaliação no Setor Público – Salvador – BA.
Blog do Florisvaldo – Informação Com Imparcialidade – 12/11/2023
7 Comentários
Em princípio e momentaneamente, eu responderia que sim!
O monopólio existente no STF é benéfico para todo os seus integrantes, mesmo que em alguns momentos (publicamente) a raiva ou a vaidade aflore na pele de alguns deles, expondo as suas diferenças, nada que não seja apaziguado (nos bastidores) pelo colegiado, pois é conveniente que permaneça “tudo como dantes no quartel d’Abrantes”. Assim, cabe aos legisladores encontrarem formas de escreverem e implantarem as reformas tão desejadas.
Parabéns! Excelente crônica. Abraços (Salvador-BA).
Amigo Agenor, esperamos, em breve se possível, uma alteração neste sistema atual de escolha para que os membros do STF sejam livres de amarras políticas e, assim, se tornem verdadeiros Guardiões das Leis. (Brusque (SC).
Mais uma boa crônica que aborda a nossa realidade. Será que veremos mudança na maneira de escolha dos Ministros? Parabéns. Salvador-BA).
CONCORDO PLENAMENTE COM A SUA POSTAGEM, FLORISVALDO!!! VERIDICA 100%. (BARRA DO MENDES-BA).
O BACANA é que todos os comentários seguem a mesma linha de concordância, e esse não poderia ser diferente no mesmo raciocínio dos demais. Tem um ditado que lembra o dá por uma mão e toma pela outra… bem o caso!
Sou um leitor fiel e entusiasmado de seus artigos.
Além da escrita primorosa, você é verdadeiramente cirúrgico ao dissertar sobre os temas que escolhe, muito principalmente sobre as particularidades e aberrações que estamos vivenciando constantemente nos três Poderes que tanto infelicitam atualmente nossa (?) Pindorama.
Nesse texto de hoje você é ainda mais brilhante, oportuno e certeiro. Realmente, é inaceitável, insuportável o que acontece com a nomeação de Juízes(?) para compor o que chamam de MAIS ALTA CÔRTE DO PAÍS. Creio mesmo que não existe aberração maior , em nenhum outro País, em processos que tais.
Enfim, vai se esgotando, extinguindo mesmo, o que nos resta de esperança de uma melhora no respeito a princípios de moralidade na coisa pública.
Efusivos parabéns e meu abraço pra você.(Salvador-BA).