O triste contraste visual que emana das fotos acima, inspira o sentimento de emoção e dor. Na primeira vemos os raios solares refletindo sobre as águas todo o seu esplendor, enchendo de luz o leito soberbo e imenso daquele rio que teima em não chegar até a foz, porque entende que ao longo de sua trajetória há uma fauna e uma flora que dele se alimentam, uma economia produtiva e redentora que oferece milhares de empregos e nas suas margens há uma população ribeirinha que contempla a sua rara beleza e grita emocionada: “não vá, eu preciso de você!”.
A segunda imagem mostra o espectro da tristeza, a secura do solo tórrido, um pequeno leito remanescente como se acumulassem apenas as lágrimas daquela gente do seu entorno, e o mais desolador, o ressurgimento de moradias antigas que foram submersas em novembro de 1976 quando ocorreu a inundação das cidades pelo Lago de Sobradinho, e que parecem ter vindo à tona gritar alto e em bom som: “eu não morri e voltei para testemunhar as maldades que lhe fizeram, meu Opará!”.
Não tive o privilégio de poder contemplar no dia a dia a beleza do “RIO OPARÁ”, como no princípio era assim chamado pelos indígenas da tribo “Centoce”, cuja expressão veio da língua tupi-guarani para retratar a imensidão das suas águas ou “Rio-Mar”. Do nome da tribo originou o nome da atual cidade de Sento Sé. Outros também o chamavam de RIO DOS CURRAIS. Em 04 de outubro de 1501, o navegador genovês Américo Vespúcio, ao se encantar com o tamanho da foz – atualmente reduzidíssima – daquele belo rio, batizou-o com o nome do Santo do Dia, ou seja: SÃO FRANCISCO.
FOTOÉ com alegria que me permito recordar que, aos 18 anos (1962), há 53 anos, morava em Feira de Santana e um grande amigo, o Enock Campos Cruz, filho de Sento Sé, convidou-me a conhecer a sua terra e a sua família. Assim, a partir de Juazeiro navegamos num vapor em direção a Sento Sé. Era uma embarcação meio de passageiros e meio carga, e lembro que parava muito nas pequenas comunidades ribeirinhas. Deixando um pouco de lado o romantismo, vamos à realidade dramática do rio hoje atingido literalmente na sua veia pelo desmatamento ao longo de suas margens, assoreado e em estado quase terminal, e que seria mais digno aos ambientalistas do governo se estivessem implantando urgentes projetos de revitalização, ao invés de uma transposição que mais parece uma sanguessuga…
Não é possível conceber uma nação sem recursos financeiros para um projeto dessa magnitude, financiando com recursos públicos uma obra que, inicialmente, foi orçada em R$4,7 bilhões e já chegou a R$8,2 bilhões…! E olha que o TCU já identificou R$876 milhões de sobre preço…! Fica a pergunta: Estão mesmo querendo levar ÁGUA para todo o nordeste ou canalizando REAIS para alimentar a corrupção? Talvez a Polícia Federal de Recife tenha encontrado a resposta: quatro empresários de peso, vinculados a empresas empreiteiras da Transposição, foram presos na última sexta-feira,11, pela “Operação Vidas Secas”, por suspeita de desvio de 200 milhões de reais na execução da obra (Jornal O Estadão, de 11/12/15). O que era apenas suposição, já começa a se tornar uma triste realidade!
Com um terço do montante do dinheiro projetado para a Transposição do Rio São Francisco, se aplicado na construção de pequenas e sucessivas barragens nos leitos secos dos rios nordestinos, evitando que o grande manancial de águas pluviais escoe para o mar, talvez alguns deles pudessem ser até perenizados! E aí recordo do nosso Rio Vaza-Barris, que nasce no município de Uauá, tem o leito totalmente seco e em uma semana de chuvas transborda as suas margens e manda para o mar um volume estupendo de água, o que abasteceria toda a região por algum tempo! Mas, e o negócio dos carros-pipas, como ficaria?
Posso estar enganado, mas não lembro de ter havido um movimento de peso reunindo as lideranças políticas de todos os municípios beneficiados com o Rio São Francisco – Governadores, Prefeitos, Senadores, Deputados Estaduais e Federais, os Vereadores e a população -, que tenham se mobilizado em algum momento em defesa do Velho Chico…! Ah, desculpem, como um grito no deserto, a Câmara de Vereadores de Juazeiro fez no último dia 4 uma Audiência Pública para discutir a “crise hídrica do rio”, quando contou com a presença do Senador Otto Alencar e do Deputado Roberto Carlos, além de prefeitos da região. Alegra-me saber que o Senador defende a Revitalização e não a Transposição como solução. Louvável a iniciativa da Câmara. Mas, com o respeito que merecem os nossos edis, será que a audiência teve como finalidade defender o Rio ou uma festa política para entrega do titulo de “Cidadão Juazeirense” ao Senador?
Comenta-se que uma TV pensa em produzir uma novela no próximo ano, explorando como tema o Rio São Francisco, e aí fico a me perguntar: O que dirão sobre o rio? Será que vão discorrer sobre o quê? Ou vão dizer apenas que por aqui um dia passou um rio…? Tomara que todas as previsões sejam vistas pela ótica da realidade, porque a imaginar a vitrine e o espaço que as novelas representam na cultura nacional, finalmente algo de bom acontecerá na vida do “Velho Chico”… Senão, essa novela não passará do papel…
É tão grave a situação, que concluo com as palavras dramáticas que ouvi de um cidadão juazeirense sobre o rio de suas paixões:
“AMIGO, AGORA SÓ A MISERICÓRDIA DE DEUS”!
AUTOR: Adm. Agenor Santos, Pós-Graduação Lato Sensu em Controle, Monitoramento e Avaliação no Setor Público.
Blog do Florisvaldo – Informação com Imparcialidade – 13/12/2015