O Tribunal de Justiça do Estado da Bahia (TJ-BA) segue realizando estudos sobre a possibilidade de fechar cerca de 100 comarcas em todo o estado, no projeto inicial existe a possibilidade das comarcas de Itiúba, Ponto Novo e Filadélfia serem agregadas à Comarca de Cansanção, porém ainda não há nada definido.
A possibilidade de desativação da comarca de Itiúba e de vários municípios do estado tem gerado polêmica, mobilizado órgãos públicos contrários à medida e levado dezenas de moradores de cidades do interior às ruas para protestar. O fechamento das unidades, sobretudo em pequenas cidades do estado, vem sendo estudado pelo Tribunal, entre outros fatores, em razão da dificuldade orçamentária enfrentada pela Corte.
O TJ-BA evita falar sobre o assunto. A assessoria de comunicação do órgão confirma que estudos estão sendo realizados, mas diz apenas que ainda não há nada definido sobre a desativação da comarca de Itiúba e dos demais municípios e nem quando e quantas devem ser fechadas. Fontes dizem que as desativações podem atingir até 100 unidades em todo o estado e que, com isso, haverá transferência de acervos e equipes de servidores.
As comarcas são onde os juízes de primeiro grau exercem a jurisdição. Elas podem abranger uma ou mais cidades, a depender do número de habitantes e de eleitores, do movimento forense e da extensão territorial dos municípios.
O número de unidades que podem ser desativadas agora é mais de duas vezes maior ao da quantidade de unidades que foram extintas na Bahia em 2011 — 43, ao todo.
Em 2015, 25 comarcas da Bahia, sobretudo de cidades pequenas e com déficit de juízes, foram agregadas a outras já existentes sem, no entanto, perderem suas estruturas físicas. Ou seja, as estruturas judiciárias continuaram existindo, mas como parte de outras comarcas maiores.
O TJ alegou, à época, que a medida foi adotada durante reforma administrativa implantada devido à baixa movimentação de processos nestas comarcas. O TJ disse, ainda, que a agregação visava oferecer melhores condições de atendimento para a população com uma melhor distribuição de processos entre os juízes.
Órgãos públicos contrários à agregação atribuíram a medida à crise orçamentária do Judiciário que impede a contratação de juízes e servidores para as unidades. A Associação dos Magistrados da Bahia (Amab), à época, apontou ausência de fundamentação legal para o agrupamento de comarcas, sob o argumento de que a medida ocasionaria aumento da competência dos magistrados, aumento da carga de trabalho e necessidade de deslocamentos rodoviários de até 60 km para realização de audiências.
Conforme a Ordem dos Advogados do Brasil na Bahia (OAB-BA), com base em dados do Conselho Nacional de Justiça (CNJ), o estado tem atualmente um déficit de 230 juízes e de mais de 25 mil servidores. Como há dois anos, quando se opôs à agregação de comarcas, a OAB-BA já se posicionou contra a desativação das unidades prevista no atual estudo.
A entidade diz ter lançado uma campanha, intitulada “Nenhuma Comarca a Menos”, e proposto o chamado Pacto Pela Justiça, que prevê uma parceria entra a Ordem e os poderes Executivo, Legislativo e Judiciário para evitar o possível fechamento de comarcas no interior e melhorar a prestação jurisdicional no estado. A Ordem informou que pretende, ainda, acionar o Governo do Estado e provocar o Conselho Nacional de Justiça (CNJ) para intervir no caso.
A assessoria do CNJ disse que ainda não há acompanhamento atual desse processo. Em 2015, quando o TJ-BA decidiu pela incorporação das 25 comarcas, o Conselho avaliou que não havia irregularidade na medida, após de ter solicitado estudo para verificação da viabilidade das agregações.
O Ministério Público informa que acompanha os estudos em curso, e instituiu, em maio de 2015, uma Comissão de Reestruturação e Otimização das Promotorias de Justiça do interior. Por meio dela, o MP analisa as consequências das desativações das comarcas no desempenho das funções do Ministério Público.
Autor de ações que visam impedir a desativação de unidades na Bahia, o procurador geral do município de Brumado, na região sudoeste, e conselheiro estadual da OAB Acioli Viana destaca que o número de unidades a serem fechadas com o atual estudo em andamento do TJ-BA ainda não é conclusivo, mas disse que a possibilidade de encerramento de 100 unidades foi levantada.
“Dentro dos critérios estabelecidos pelo TJ-BA, foram apresentadas algumas percepções iniciais que levariam ao fechamento de 100 comarcas, mas isso ainda não está definido porque o Tribunal não apresentou a conclusão dos trabalhos. Anteriormente, o projeto de agregação de comarcas não apresentou eficácia porque os processos continuam acumulados por falta de juízes. As agregações foram realizadas através de resolução que o próprio TJ emitiu. Nesse caso de agora, que é mais impactante, em se tratando de extinção das comarcas, por alterar a estrutura organizacional do poder Judiciário, necessariamente deveria passar por um projeto de lei”, destacou Viana.
O procurador rebate o argumento do Tribunal de que há baixa movimentação de processos nas comarcas como justificativa para desativação das unidades. “Essas comarcas não têm juiz. Como vão fazer processo sem juiz? O posicionamento da OAB é de que não se feche nenhuma comarca. Questionamos a metodologia que está sendo implantada para identificação de critérios que justifiquem o fechamento dessas comarcas. Existe uma resolução do CNJ que estabelece parâmetros para fazer essa identificação e entendemos que isso não está sendo obedecido. Por isso, a Ordem deliberou no sentido de acionar o Estado para poder fazer com que o Tribunal, em vez de fechar comarcas, contrate os juízes necessários para preencher essas comarcas”, afirmou.
Segundo o CNJ, de acordo com dados do Módulo de Produtividade Mensal mantido pelo Conselho com informações dos tribunais de cada estado, o TJ-BA tem hoje varas de Justiça em 236 comarcas, das quais 165 têm produtividade indicada, ou seja, processos em tramitação, e 71 não têm. O órgão informou que não tem dados específicos sobre o número de juízes em cada comarca e que só tem o dado geral referente ao número total de magistrados na Bahia. Conforme o CNJ, o estado conta hoje com 554 juízes. O órgão não soube informar se falta de produtividade indicada em algumas comarcas se deve a falta de juízes nessas unidades.
O procurador Acioli Viana diz que o fechamento das comarcas representa um esvaziamento do poder judiciário e afirma que é preciso uma discussão mais ampla no sentido de que se leve em consideração os dois graus de jurisdição para avaliar redistribuição de servidores.
“O que se pretende, na verdade, é reduzir o número de unidades e fazer o redirecionamento de servidores para conseguir cumprir índices de cumprimento de gastos com pessoal e, assim, atender à Lei de Responsabilidade Fiscal. Além disso, o que identificamos é que grande parte dos gastos do Judiciário se concentram na instância superior, enquanto a grande demanda de processos está nas comarcas de primeiro grau. É preciso fazer esse estudo sobre o segundo grau para redimensionar servidores ao primeiro grau e, somente, depois, fazer a identificação de eventuais necessidades. É inconstitucional essa vedação de acesso à Justiça vinculado ao índice de pessoal. A gente não pode compactuar com isso”, disse.
A Associação dos Magistrados da Bahia (Amab), que em 2015 chegou a contestar o agrupamento de comarcas pelo TJ-BA porque, segundo o órgão, não houve um estudo mais elaborado que fundamentasse a decisão, hoje é favorável à desativação de unidades, porque, de acordo com o órgão, o TJ não tem verba para arcar com as despesas de todas as unidades do estado.
“O ideal é que toda cidade tivesse uma comarca, mas estamos falando de Brasil e da Bahia, onde os recursos em épocas de crise são escassos. Tem comarcas com demandas processuais de apenas 400 ou 500 processos anuais e fica inviável para o TJ sustentar essas comarcas. O TJ, na verdade, cumpre determinação do CNJ, que diz que o ideal é que a comarca tenha no mínimo 800 processos distribuídos por ano para poder existir”, destacou o presidente da Amab, Freddy Itta Lima.
Lima ainda destaca que, com as desativações e transferências de documentos para outras unidades com juízes, os processos que estão parados poderão se retomadas. “Os processos serão transferidos para uma comarca central e os que estão parados poderão ser julgados. Haverá uma prestação mais eficiente do serviço. Não adianta ter comarca, demanda, e os processos não serem julgados por falta de juiz. Por isso, hoje a associação concorda com a desativação. Caso futuramente se tenha recursos, podemos pensar em reativar essas comarcas”, destacou.
O Sindicato dos Servidores do Poder Judiciário do Estado da Bahia (Sinpojud) diz, no entanto, que a desativação das comarcas prejudica a população e os trabalhadores que atuam nas unidades a serem encerradas.
“Esse projeto já vem de outras gestões e sempre o Sinpojud promove mobilizações para barrar o avanço. Além do transtorno causado aos servidores, quem mais é afetado com isso é a sociedade que vai ter cerceado o acesso à Justiça. É uma afronta ao princípio constitucional. Os moradores vão ter que se deslocar de 60 a até 100 quilômetros, com custo próprio, para pleitear seus direitos. Já os servidores, que fazem concurso, que estabelecem vínculos e constroem residência nas cidades onde trabalham, terão também de se deslocar com suas famílias para executar suas atividades ocupacionais”, diz o diretor do Sinpojud Jorge Cardoso Dias.
Dias ainda diz que, assim como as medidas anteriores tomadas pelo TJ-BA, a desativação das comarcas não deverá surtiram efeito. “Com as agregações, as comarcas não tiveram evolução. Os processos foram transferidos e não foi dado andamento. Não tiveram nenhuma resolução e continuam na fila de processos”, destacou.
Fonte: https://www.portaldenoticias.net – Com informações do G1
Blog do Florisvaldo – Informação Com Imparcialidade – 08/06/2017