Plantação de laranja na fazenda Santa Tereza Pirassununga, interior de São Paulo – Causada pelo psilídeo, doença chamada ‘greening’ avança sobre pomares de SP e MG, reduz produção e mobiliza agricultores – Foto: Edilson Dantas
O Brasil trava uma luta contra um inseto minúsculo, que mede entre 2 e 3 milímetros, mas representa uma ameaça gigantesca a uma lavoura importante para o país. Trata-se do psilídeo, transmissor de uma bactéria causadora do greening, doença que ataca plantações de laranja inibindo o crescimento dos frutos, que caem do pé verdes, antes de amadurecerem, e ficam com um sabor amargo. A infestação dessa praga alcançou um grau assustador nos laranjais paulistas e no Triângulo Mineiro, que formam o principal polo citricultor do país, e preocupa o segmento exportador que movimenta cerca de US$ 15 bilhões (R$ 88 bilhões) por ano e gera 200 mil empregos.
No levantamento mais recente do Fundo de Defesa da Citricultura (Fundecitrus), a incidência da doença subiu de 38,06% em 2023 para 44,35% em 2024 em São Paulo e Minas, que respondem por quase 80% da produção nacional. Foi o sétimo ano consecutivo de alta. A praga afetou cerca de 90 milhões das 203,7 milhões de laranjeiras dessa região.
– Esse patamar de 44% representa uma média. Há cinco regiões de São Paulo onde a incidência do greening passa de 60%. Mas há cidades como Limeira, Brotas e Porto Ferreira onde este índice passa de 70%. Eu diria que acendeu a luz vermelha – afirma Renato Bassanezi, pesquisador do Fundecitrus, entidade mantida pelos produtores e pela indústria da citricultura que se tornou referência mundial em pesquisa e ações de combate à doença.
Essa incidência tão elevada facilita a contaminação de plantas sadias e dificulta a renovação dos pomares. O pesquisador explica que o grande problema é que o greening é uma doença sistêmica, sem cura. A forma como ela se espalha, ele diz, é semelhante à da dengue. Se um produtor se previne do inseto, mas o vizinho não faz nada, a doença pode cruzar a cerca de uma propriedade para outra, seja uma fazenda ou um pequeno sítio.

O psilídeo suga a planta contaminada pela bactéria e a espalha em outras árvores do pomar. A bactéria obstrui o fluxo da seiva, e a planta vai definhando, perde produtividade. Frutos caem verdes e são perdidos. As plantas mais jovens, observa Bassanezi, têm um agravante. Por causa das muitas brotações, ficam mais expostas ao inseto, o que reduz as chances de serem produtivas.
Colheita encolheu
Na safra 2024/25 do cinturão citrícola paulista, segundo dados do Fundecitrus, foram produzidas 230,87 milhões de caixas de laranjas. A colheita foi 24,85% inferior à da safra anterior, de 307,22 milhões. As condições climáticas adversas, como a seca do ano passado, prejudicaram a lavoura, mas a maior severidade do greening foi determinante.
Produtor de Pirassununga, a 223 quilômetros da capital paulista, Brayan Palhares se deparou com o greening pela primeira vez em 2005, mas a avaliação era de que se tratava de mais uma praga comum no laranjal. Mas a doença se mostrou o seu maior desafio. Sua fazenda, a Santa Tereza, está na região considerada “o olho do furacão do greening”, com mais de 50% de incidência.
– Hoje, quando identificamos uma árvore doente, cortamos. Plantamos uma muda sadia no lugar. Só na safra passada, foram 25 mil pés cortados. É muita coisa. Seguimos todos os protocolos de inspeção e de controle do psilídeo – conta Palhares, que tem 800 mil pés de laranja e calcula que a incidência da doença em sua plantação seja de apenas 6% hoje.

– Essa mudança pode ter facilitado o avanço da doença. A eliminação da planta doente era mais eficaz para o controle do greening – diz Yamamoto.
Procurada, a atual gestão do Ministério da Agricultura não se pronunciou.
Segundo Yamamoto, ainda não há variedades genéticas comerciais resistentes à doença. Pesquisas nesse sentido estão avançando, mas ainda levam tempo. Portanto, prevenção ainda é a forma mais eficaz de conter a praga que afeta laranjas e outros frutos cítricos, como limão e tangerina.
Outro problema que a Fundecitrus identificou, a partir de 2020, foi a resistência do psilídeo aos inseticidas que eram utilizados. Muitos produtores usavam a marca mais barata e não alternavam produtos, o que criou uma legião de insetos resistentes a um determinado tipo de produto.
– É preciso usar inseticidas com diferentes modos de ação para evitar a seleção de indivíduos resistentes. Além disso, havia intervalos muitos longos entre as aplicações – diz Bassanezi, que defende o chamado manejo conjunto, em que todos os produtores, incluindo os pequenos, fazem ações coordenadas de prevenção.
Temperaturas elevadas, diz o pesquisador da Fundecitrus, são desfavoráveis à praga. Nos laranjais do norte de São Paulo, mais quente, há menor contaminação. O psilídeo para de se reproduzir com muito calor, mas hiberna em temperaturas em torno de 10 graus.

Devastação nos EUA
Nos EUA, a Flórida é o principal exemplo do que pode acontecer se o greening não for detido. Maior produtor global de suco de laranja na década de 1990 — hoje esse posto é do Brasil —, o estado americano viu seus laranjais serem devastados pela praga. A produção caiu mais de 90%, de 250 milhões de caixas para algo como 20 milhões anuais, segundo dados mais recentes do Departamento de Agricultura dos EUA. No passado, o greening também já tinha sido detectado na China, onde é chamado de HuangLongBing (HLB), a “doença do dragão amarelo”.
Mesmo com o aumento do número de árvores afetadas, a boa notícia é que o ritmo de contaminação vem diminuindo no Brasil, indicando o sucesso das ações de prevenção. A alta de 6,29 pontos percentuais na incidência no período 2023/24 foi significativamente menor que a de 13,66 pontos de 2022/23. Para a Fundecitrus, é um bom indicativo, mas o cenário ainda preocupa.
– Provavelmente, vamos ter mais um aumento neste ano, mas deve ser menor que em 2024. Se a incidência média chegar em 50% já é um alívio porque não é aquele crescimento explosivo. Sabemos o que fazer e precisamos ter a colaboração do agricultor – diz Bassanezi, da Fundecitrus.
A Secretaria de Agricultura de São Paulo informou que entre 2023 e 2024 foram realizadas 2,7 mil fiscalizações de prevenção ao greening no estado, e quase 10 milhões de mudas infectadas foram tiradas de circulação. A secretaria vem capacitando fiscais e fazendo palestras de orientação aos produtores.
O Fundo de Expansão ao Agronegócio Paulista (Feap), através do Projeto de Apoio ao Combate do Greening, disponibilizou R$ 6,15 milhões para que agricultores tomem medidas preventivas e de controle da doença. Também foi criado o Centro de Pesquisa Aplicada em Inovação e Sustentabilidade do setor citrícola, com investimentos de R$ 90 milhões nos próximos cinco anos.
Fonte: https://oglobo.globo.com – Por João Sorima Neto – São Paulo
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