Edifício Joelma: incêndio deixou 187 mortos, em 1974 – Segundo pior incêndio em arranha-céu no mundo começou com curto-circuito em ar-condicionado e deixou 187 mortos, expondo falhas de segurança
A professora Volquimar Carvalho dos Santos, de 21 anos, trabalhava tranquilamente como digitadora no setor de processamento de dados de um banco, no 23º andar do Edifico Joelma, em São Paulo, quando sua manhã foi interrompida por uma das maiores tragédias da História do Brasil. Naquela sexta-feira, dia 1º de fevereiro de 1974, há 50 anos, um incêndio que começou com o curto-circuito em um aparelho de ar condicionado consumiu 14 dos 25 andares, deixando 187 mortos e 300 feridos.
O Brasil ficou em choque com as imagens de pessoas saltando das janelas e sacadas em meio a um inferno de chamas e fumaça. Foi o segundo pior incêndio em arranha-céu do mundo, atrás apenas do colapso do World Trade Center após os atentados terroristas de 11 de setembro de 2001.
O Edifício Joelma foi erguido no terreno de uma casa onde, em 1948, o professor de química Paulo Camargo, de 26 anos, assassinara a mãe e suas duas irmãs a tiros. Ele enterrou os corpos em um poço no quintal do imóvel e se matou depois. Demolido, o imóvel deu lugar ao prédio, inaugurado em 1972 e alugado pelo Banco Crefisul, que ocupava boa parte da construção. Depois do incêndio, o local passou por uma reforma de quatro anos e foi reaberto com o nome de Edifício Praça da Bandeira.
Edifício Joelma: Homem se atira do alto do prédio, durante incêndio – Foto: Antônio Carlos Piccino/Agência O GLOBO
Continua sendo um centro comercial, mas tem fama de mal-assombrado. Funcionários relataram ter ouvido gritos fantasmagóricos. Outros creem ter visto rostos de vítimas da tragédia. Reza a lenda que as almas de 13 pessoas mortas num elevador, durante o incêndio, perambulam pelo prédio.
Na primeira página do GLOBO do dia seguinte à catástrofe, a foto de um homem em queda livre após se jogar do prédio transmitia o horror. O jornal enfatizou os problemas de segurança no edifício, que não tinha escada adequada e nem heliponto. Quando o fogo começou, a fumaça logo tomou conta da estreita escada, impossibilitando a descida. Muitos se salvaram contrariando regras básicas nesse tipo de situação, como usar os elevadores, mas estes pararam de funcionar rapidamente.
Um curto-circuito no sistema de refrigeração do 12º andar gerou a explosão que iniciou o incêndio, às 8h50. Em minutos, as chamas atingiam o 25° andar. Três viaturas do Corpo de Bombeiros chegaram às 9h, mas a situação já estava tão crítica que quatro pessoas haviam saltado do edifício e morrido.
Foto 3 – Edifício Joelma: Chamas consumindo prédio e pessoas tentando se salvar – Foto: Antonio Carlos Piccino/Agência O GLOBO
Nas horas seguintes, centenas de socorristas se esforçaram para superar as dificuldades e salvar o máximo de vidas. Foram usadas quatro escadas Magirus, mas os equipamentos não chegavam até os andares mais altos. Os bombeiros lançavam jatos d’água no prédio, mas os hidrantes apresentaram problemas. A solução foi o envio de dezenas de carros-pipa. Mas, a todo momento, a multidão reunida perto do Joelma levava as mãos à boca quando assistiam a vítimas se atirando ou caindo do edifício. O som de seus corpos se chocando na calçada era aterrorizante.
Estava fresca na memória da população o incêndio do Edifício Andraus, em 1972. A tragédia deixara 16 mortos, mas várias pessoas foram resgatadas do terraço por helicópteros. Durante a correria no Joelma, muita gente subiu ao topo com a mesma esperança, mas as aeronaves não tinham onde pousar. Apenas com 1h30 de incêndio, chegou um helicóptero da FAB potente o bastante para ficar parado no ar enquanto o resgate era feito com cordas. Dezenas já tinham morrido no telhado.
Por volta das 10h, um rapaz que se esforçava tentando descer do 16º andar para o 13º, utilizando uma corda improvisada com roupas, para chegar a uma escada Magirus, caiu lá do alto e, durante a queda, derrubou mais três pessoas, inclusive um bombeiro. Todos eles morreram.
Edifício Joelma: Helicóptero perto do topo do prédio – Foto: Arquivo/Agência O GLOBO
No entorno do prédio, ambulâncias de instituições públicas e privadas prestavam socorro aos feridos. Litros de leite, cobertores e medicamentos foram enviados, a pedido de médicos que se desdobravam para ajudar sobreviventes. Soros, antibióticos e seringas hipodérmicas eram recebidas. Um posto foi instalado ao ar livre para reunir doadores de sangue. Logo, centenas de voluntários chegaram na área para contribuir. Duas grandes filas se formavam. Ninguém parava de olhar para cima.
Árvores eram derrubadas a machadadas, para permitir o pouso dos helicópteros na praça, a fim de recolher feridos. Bombeiros, com megafones, gritavam para os que estavam descendo pela Magirus: “Atenção! Atenção! Segurem-se bem na escada. Desçam com firmeza”. Corpos de pessoas que caíram do alto do prédio ou que foram retiradas de dentro do edifício se amontoavam nas ruas, cobertos por mantas. Sobreviventes e bombeiros eram atendidos com sintomas de asfixia.
Edifício Joelma: Uma pessoa cai em meio a fumaça que toma prédio – Foto: Antonio Carlos Piccino/Agência O GLOBO
Por volta das 10h30, o fogo começou a perder força, mas o drama continuou até o início da tarde. Os relógios marcavam 15h quando o Corpo de Bombeiros informou que não havia mais ninguém vivo dentro do Joelma. Mas dezenas de corpos ainda seriam encontrados, a maioria carbonizados.
A tragédia expôs a falta de segurança nos prédios de São Paulo. Seis dias depois, a prefeitura local publicou novas regras para edifícios que seriam construídos. Um dos principais problemas do Joelma foi a quantidade de material inflamável. O novo regulamento previa, entre outras coisas, que os prédios deveriam se precaver nesse sentindo, usando material resistente ao fogo nos locais adequados. Além disso, chuveiros “sprinklers” deveriam ser instalados. Um ano depois, a prefeitura promulgou uma lei aprovando o Código de Edificações do município, que a ampliou as exigências do decreto anterior.
Em 1979, foi lançado o filme “Joelma, 23º andar”, dirigido por Clery Cunha, baseado em “Somos Seis”, obra psicografada pelo Chico Xavier. No livro, o médium transcreve uma carta de Volquimar Carvalho dos Santos, que trabalhava no 23º andar do prédio. Ela tentou fugir pelas escadas, mas não conseguiu e buscou abrigo no terraço. Acabou morrendo por asfixia. O irmão dela, que trabalhava no 10° andar, sobreviveu. A atriz Beth Goulart interpreta Volquimar, mas a personagem se chama Lucimar.
O combate ao incêndio no Edifício Joelma em 1974 – Foto: Arquivo/Agência O GLOBO
Fonte: https://oglobo.globo.com
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