De vez em quando, apraz-me percorrer o estoque literário das minhas crônicas – algumas centenas -, não somente para uma autocrítica avaliativa do trabalho, mas, também, para ter o prazer de me realimentar diante dos momentos inspirativos e dos comentários tão primorosos quão generosos, por parte de diletos leitores.
Ao mexer nessa modesta memória, repleta de diversificados temas, eis que surgem tanto múltiplos fatos do cotidiano e reflexões sobre a política nacional, assim como cenários de encantos e belezas, oriundos dos meandros férteis da imaginação.
Em razão da recente Pandemia, os nossos movimentos se tornaram condicionados a espaços e hábitos restritos, o que nos leva a viajar no tempo, revivendo as saudades de passeios nacionais e internacionais, os afáveis encontros com os amigos, visitar cidades etc. Com mais tempo para pensar, obviamente que as reflexões nos despertam para boas ou, às vezes, más recordações.
Ao reservar um momento para lembranças, é impossível alguém não pensar no querido rincão de Uauá, a “Capital do Bode”, emblemático solo sertanejo que nos remete à descoberta dos encantos do sertão. E inspirado num instante de romantismo, os nossos olhos são levados a enxergar como é belo O LUAR DO SERTÃO!
Justamente conquistado pelo deslumbramento dessa imagem, foi o poeta Catulo da Paixão Cearense, quem exaltou com singela e rara exuberância as inolvidáveis belezas do Luar do Sertão. Quem, em algum momento da vida, já não cantou com enlevo e romantismo os versos desse verdadeiro hino de louvação ao sertão? “Não há, ó gente não há, luar como este do sertão”, traz o estigma da paixão profunda pelos encantos das terras semiáridas do sertão, que não têm as águas verdes do mar a banhá-las, mas tem a noite iluminada pela riqueza celestial dos astros.
Quando escura, a noite é o apanágio dos fracos e dos possuídos por inconfessáveis propósitos; quando sob o brilho suave do luar, torna-se o aconchego dos boêmios e românticos, envolvidos pelas doçuras do amor.
A divindade sábia e incomensurável do Criador estabeleceu regras básicas de justiça e convivência com a grandiosidade da criação. Tudo foi dividido com equidade. Se de um lado as agruras da seca trazem ao sertão a fome, o sofrimento e a morte, ao litoral a chuva traz a tragédia das águas, inundando de dor o desprotegido homem urbano. Se o mar banha as praias e traz um refrigério de paz e prazer aos seus veranistas, o sertão tem o privilégio do luar inusitado e encantador, sem qualquer similaridade com as noites metropolitanas, cujas montanhas de cimento ofuscam e impedem o deleite do luar.
Então, é aí onde o Luar do Sertão resplandece com altivez, e de forma encantadora e majestosa surge por detrás da caatinga, abrindo espaços para a sua luz deslumbrante!
A caatinga, baixa ou rasteira, no crepitar dos seus galhos secos e sol implacável, parece aguardar os estertores finais de uma vida de seca, como se hibernasse à espera de uma gota da chuva salvadora. Durante o dia os buracos no solo ou as lapas de pedras se tornam no esconderijo protetor dos répteis, que fogem do calor abrasador do sertão; à noite, por entre os gravetos e cipós retorcidos eles saem à caça ou simplesmente buscam a contemplação do luar, favorecidos na sua pequenez pela natureza que desfolhou as árvores, como se lhes abrissem as cortinas da beleza e do encantamento.
Tenho o privilégio de ser sertanejo por adoção espontânea. A experiência com o solo e a gente sertaneja trouxe-me lições de sensibilidade de como é viver e sentir o sertão, com as suas carências e grandiosidades.
Autor: Adm. Agenor Santos, Pós-Graduação Lato Sensu em Controle, Monitoramento e Avaliação no Setor Público – de Salvador – BA.
Blog do Florisvaldo – Informação Com Imparcialidade – 29/10/2023
7 Comentários
Caro Agenor, parabéns!
A cada semana você surpreende o editor, consequentemente os leitores, com aquilo que compõe o editorial.
Tenho a convicção que se vivo fosse, Catulo da Paixão Cearense (que não era Cearense) teria orgulho em poder compartilhar essa pérola escrita por você, principalmente quando diz: “Tudo foi dividido com equidade. Se de um lado as agruras da seca trazem ao sertão a fome, o sofrimento e a morte, ao litoral a chuva traz a tragédia da ságuas, inundando de dor o desprotegido homem urbano. Se o mar banha as praias e traz um refrigério de paz e prazer aos seus veranistas, o sertão tem o privilégio do luar inusitado e encantador, sem qualquer similaridade com as noites metropolitanas, cujas montanhas de cimento ofuscam e impedem o deleitedo luar.” Florisvaldo F dos Santos
Para comprovar o que disse no comentário anterior, veja o vide do link abaixo: https://www.google.com/search?q=luar+do+ser&sca_esv=577595109&tbm=vid&sxsrf=AM9HkKnAEuQW40cfIsd3ySV7VRx0GGZc3A:1698578533713&source=lnms&sa=X&ved=2ahUKEwjf2_-QkpuCAxXPP7kGHUeLBywQ_AUoAXoECAYQAw&biw=1536&bih=754&dpr=1.25#fpstate=ive&vld=cid:5f6ca4b2,vid:EkjvlXL_bVw,st:0
Muito bom dia, nobre “Poeta” das crônicas!
Inspiração divina essa sua.
Ressaltar o Sertão é típico de quem adora/venera esse solo maltratado pelas adversidades do tempo, mas recompensada pela própria natureza todas as tardinhas – como cantado em verso e prosa pelo grande Catulo e aqui muito bem relembrada por Vosmicê.
Parabéns por mais essa merecida homenagem ao nosso Sertão e a beleza ímpar de seu Luar. (Salvador-BA).
Incontestavelmente nota 1.000.000.000.000! PARABÉNS!
Somos nordestinos com muito orgulho. (Salvador-BA).
Lendo a sua crônica me deparei com um poeta que habita nessa mente brilhante, hoje vi uma narrativa Euclidiana na riqueza dos detalhes da nossa paisagem nodestina, parabéns pela belissima crónica!
(Irecê-BA).
Obrigado pela página literária.
A verdade, amigo, é que o ESCRITOR tem uma sensibilidade diferenciada, bem próxima dos “primos” poetas, quando não coincide possuir as duas competências especiais, simultaneamente.
Esse dom é presente especial de DEUS que lhes incumbiu de intermediar a comunicação com os menos sensíveis e despertar neles uma possível reflexão, e, às vezes, até um momento de meditação.
PARABÉNS! (Salvador-BA).
REALMENTE há uma unanimidade entre os comentários por tudo que o Artigo nos traz de bom, a respeito das qualidades de um povo trabalhador por natureza. Disse tudo sobre nós, e só temos que agradecer pelas linhas dedicadas em nosso favor e reconhecimento .