Recentemente um paciente me questionou se o HIV realmente causava aids, teria se informado que havia iminentes cientistas internacionais que afirmavam que o HIV seria um vírus inofensivo, e que o que causaria aids seriam os medicamentos do coquetel (antirretrovirais), que o AZT era um veneno.
Como tenho visto essa questão circular nas redes sociais, e por ser baseada em teses absurdas que já foram há tempos desacreditadas pela comunidade científica internacional, vale compartilhar algumas impressões.
A aids foi descrita no início dos anos 1980, quando surgiram os primeiros casos documentados no ocidente a partir dos Estados Unidos da América, em 1983 dois grupos distintos, um da França (Luc Montagnier) e outro dos Estados Unidos (Robert Gallo) propuseram que a aids era causada por um vírus que mais tarde seria denominado HIV. Nos anos 1980 essa doença se espalhou pelo mundo sem nenhuma possibilidade de tratamento, a aids apresentava então cem por cento de mortalidade em poucos meses. Apenas em 1987 descobriu-se que o AZT, até então utilizado como quimioterapia para câncer, tinha efeito contra o HIV, porém o vírus apresenta muitas mutações e rapidamente surgiam variáveis resistentes.
Na mesma época um professor de Química, chamado Peter Duesberg, defendeu a tese de que o HIV não causaria aids, mas o uso de drogas, incluindo os antirretrovirais. Essa possibilidade ganhou alguma repercussão em uma época em que a aids ainda era pouco entendida, doença letal sem possibilidade de tratamento.
A partir de 1996 a comunidade científica internacional tomou conhecimento da eficácia dos chamados coquetéis, combinação de ao menos três medicamentos, a terapia antirretroviral altamente eficaz. Desde então milhões de pessoas se beneficiaram dessa que deve ser das mais belas descobertas da medicina, ao bloquear a capacidade de multiplicação do HIV, muitas pessoas com doenças muito graves se recuperaram mesmo de estados com risco imediato de morte e voltaram a desenvolver as suas potencialidades. Eu mesmo tive oportunidade de acompanhar algumas dezenas de pessoas nessas condições.
A infecção pelo HIV ainda apresenta muitos desafios, como a vulnerabilidade das pessoas infectadas, a dificuldade de adesão aos medicamentos, os desafios para dispor do medicamento em diversos países e o preconceito, mas deixou de ser uma doença incontrolável: as pessoas com acesso à terapia (e suporte emocional, econômico e social) em momento oportuno, como regra, melhoram e podem seguir oss curso de suas vidas em busca de suas realizações.
A Revista Superinteressante em 2001 repercutiu entrevista com o professor Duesberg, afirmando que o HIV não causaria aids e essa entrevista tem tido repercussão nas redes sociais nos últimos anos, a própria revista lançou nota visando esclarecer que se trata de uma teoria ultrapassada, sem respaldo científico.
A vocês que leram esse texto até aqui, peço que desmintam essa desinformação. HIV é a causa de aids, e encarar esse fato concreto e estimular as pessoas infectadas ao correto seguimento médico é a melhor maneira de evitar que evoluam com essa doença e ainda para diminuir (muito!) as chances de transmissão.
Divulgar que o HIV é um vírus inofensivo é um atentado grave à saúde das pessoas, um ato de irresponsabilidade.
É médico infectologista e professor de Propedêutica Clínica na Universidade de São Paulo.
Blog do Florisvaldo – Informação com Imparcialidade 21/05/2015
Florisvaldo Ferreira dos santos
Consultor de Seguros e Benefícios