A questão não é nova, mas, talvez, esteja perto de uma definição por parte do Poder Legislativo, com o PLS 111/15. Sobre os argumentos “redução da litigiosidade” versus “aumento de custos”, o site do CVG-SP ouviu atuários e o senador José Medeiros (foto), autor do projeto.
A exigência de exame médico prévio para a contratação de seguro de vida, uma das antigas polêmicas no ramo de pessoas, já rendeu muitos debates, sem, no entanto, se alcançar uma solução. O imbróglio da questão parece residir no artigo 766 do Código Civil, o qual define que: “Se o segurado, por si ou por seu representante, fizer declarações inexatas ou omitir circunstâncias que possam influir na aceitação da proposta ou na taxa do prêmio, perderá o direito à garantia, além de ficar obrigado ao prêmio vencido”. O parágrafo único do mesmo artigo estabelece, ainda, que: “Se a inexatidão ou omissão nas declarações não resultar de má-fé do segurado, o segurador terá direito a resolver o contrato, ou a cobrar, mesmo após o sinistro, a diferença do prêmio”.
A questão é que, na interpretação de alguns tribunais, a seguradora que não realizar o exame não poderá negar indenização ao segurado, ainda que este tenha omitido ou mentido a respeito de doenças preexistentes. Alguns juízes entendem que caberia à ré, no caso, a seguradora, demonstrar a má-fé do segurado ao tempo em que este prestou as informações relativas ao seu estado de saúde.
“De fato, nos termos da jurisprudência dominante do Superior Tribunal de Justiça (STJ), a seguradora não pode ser eximida do dever de indenizar, alegando omissão de informações por parte do segurado, se dele não exigiu exame médico prévio à contratação do seguro − a não ser que o segurado tenha comprovadamente agido de má-fé, ocultando ou dissimulando informações sobre o seu estado de saúde, no intuito de influenciar a análise de risco da seguradora”, registra o senador José Medeiros (PPS-MT) na justificação do Projeto de Lei do Senado nº 111/2015, de sua autoria, apresentado ao Senado Federal no final de março.
Em seu projeto, o senador Medeiros propõe acrescentar o artigo 799-A ao Código Civil, estabelecendo a prévia realização de exame de saúde antes da contratação de seguro de vida. De acordo com a redação do artigo, “é lícito exigir que a pessoa interessada se submeta a exame de saúde previamente à contratação de seguro de vida”. Porém, em seguida, o primeiro parágrafo ressalva que “na hipótese de dispensa do exame de saúde, o segurador não poderá se eximir do dever de indenizar, alegando omissão de informações por parte do segurado”.
O senador acrescenta, ainda, à proposta a proibição em relação ao uso de testes ou de informações genéticas para determinar ou estimar o risco de morte ou de desenvolvimento de doenças. Por fim, informa que “é nula a cláusula contratual que exclui o pagamento do capital segurado apenas com base em declarações inexatas ou na omissão de informações relevantes em questionário sobre o estado de saúde do segurado, salvo prova inequívoca de má-fé”.
“Check up grátis”
“Se a não exigibilidade de exames pressupõe a obrigatoriedade de pagamento de capital segurado, a utilização de Declaração Pessoal de Saúde estaria anulada e automaticamente proibida?”, questiona o atuário e presidente do CVG-SP, Dilmo B. Moreira. Quem responde é o próprio senador José Medeiros, em entrevista exclusiva ao site do CVG-SP: “Caberá aos seguradores julgarem dispensável, ou não, a DPS, que, a meu ver, agrega segurança ao exame médico prévio”.
De acordo com o senador Medeiros, “a seguradora é livre para exigir o exame que achar necessário para efetivação contratual”. Mas, ele discorda da interpretação de que o PLS 111/15 “obriga” à realização do exame. “O exame médico pode ser dispensado. Isso não gera responsabilidade automática da seguradora, pois a única hipótese em que ela não pode se eximir de indenizar é alegando omissão de informação do segurado”, disse.
O advogado Ayrton Pimentel disse, certa vez, em evento do setor sobre a questão, que a adoção de exame prévio não afasta a discussão sobre a veracidade das declarações prestadas pelo segurado ao médico. Mesmo porque, disse, “admitir que alguém, por se submeter a um exame médico, esteja autorizado a fornecer informações inexatas ao segurador ou ao médico, é subverter toda a ordem jurídica assentada na boa-fé”.
Na opinião de Pimentel, o exame médico prévio seria um fator de discriminação social, já que seu custo seria repassado aos consumidores, afastando o seguro dos menos favorecidos, que são os que mais precisam. A anamnese, que consiste no simples ato de o paciente revelar ao médico seu histórico clínico, seria um procedimento menos oneroso e, segundo ele, “equivalente à DPS”. Mas, reconhece que também na anamnese o segurado poderia omitir ou alterar circunstâncias relevantes para um correto diagnóstico médico. “E, assim, volta-se à estaca zero”, raciocinou Pimentel.
O médico Marco Antonio Gazel, fundador da MA Gazel Assessoria Médico Securitária, expressa opinião semelhante. Para ele, o simples exame médico não é suficiente para avaliar condições clínicas de um individuo, pois qualquer diagnóstico de doença grave poderá não ser comprovado se o sintoma for omitido pelo interessado (ex: câncer em fase inicial, AIDS etc.). “Se nesta avaliação houver necessidade de exames complementares ou opinião de um especialista, quem será o responsável por esta despesa?”, indaga. Gazel é enfático ao analisar a consequência de tal ônus recair sobre seguradoras: “qualquer individuo poderá ter um check up grátis”.
Custo é o “nó” da questão
Para Dilmo B. Moreira, este é o grande “nó” da questão, ou seja, o pagamento dos custos para a realização do exame. “Se as seguradoras exigirem a realização de exames, seus custos de execução certamente aumentariam o valor final na negociação de contratação do seguro”, pondera.
Exceto pela questão do custo, o atuário e diretor de Seguros do CVG-SP, Marcelo de Figueiredo, analisa, por outro lado, que sob a ótica da subscrição de riscos o exame médico prévio oferece condições melhores de se avaliar o risco de acordo com suas características próprias. “Também poderia melhorar o processo de tarifação, tornando-o mais justo em relação ao custo envolvido”, diz.
Sobre a possibilidade de redução da litigiosidade no seguro vida, como justifica o senador em seu projeto, o atuário entende que dependerá de um processo de amadurecimento em relação à função primordial do seguro de pessoas. Segundo o senador Medeiros, a redução de litígios é apenas um dos benefícios que se espera do projeto. “Em longo prazo, tais medidas trarão estabilidade e segurança ao mercado de seguros, haja vista que tanto o segurado não será mais um hipossuficiente na relação contratual, como as seguradoras se esforçarão para a prestação de um serviço transparente e de qualidade”, disse.
Ele informou que o PLS 111/15 está na Comissão de Constituição, Justiça e Cidadania, na qual até o momento aguarda designação de relator. Por ser terminativo nesta comissão, o senador acredita que sua tramitação no Senado Federal será rápida. “A indefinição temporal se encontra após sua tramitação nesta Casa Legislativa, quando o projeto é encaminhado à Câmara dos Deputados e participa de novo trâmite procedimental”, explicou.
Fonte: CVG/SP – Texto: Márcia Alves
Blog do Florisvaldo – Informação com imparcialidade – 10/04/2015
Florisvaldo Ferreira dos Santos
Consultor de Seguros e Benefícios