O Nordeste voltou a ser a região mais afetada. Dos 158,4 mil benefícios a menos em março, 96.861 (ou 61,1% do total) foram retirados justamente da região que responde por metade dos benefícios totais do país.
Em janeiro, das famílias que ingressaram no programa, apenas 3% eram do Nordeste, o que gerou uma série de críticas.
O número de beneficiários é o menor do governo Jair Bolsonaro e o menor desde maio de 2017, quando o Bolsa Família teve o maior corte da história do programa — 543 mil bolsas foram retiradas.
Emancipação dos beneficiários
Em resposta ao UOL, o ministério explicou que a redução ocorreu porque novas 185 mil famílias ingressaram no programa, mas 330 mil “se emanciparam” por apresentarem evolução nas condições financeiras, “ou seja, superaram as condições necessárias para a manutenção do benefício”.
“É importante destacar ainda que os cancelamentos estão relacionados aos procedimentos rotineiros de averiguação e revisão cadastrais”, diz a pasta.
O Bolsa Família atende famílias que vivem em situação de extrema pobreza, com renda per capita de até R$ 89 mensais, e de pobreza, com renda entre R$ 89,01 e R$ 178 mensais. Se a renda per capita for maior do que isso, a família é retirada do programa.
Ainda segundo a pasta, “vale lembrar que o número de beneficiários flutua a cada mês em virtude dos processos de inclusão, exclusão e manutenção de famílias”.
Segundo o ministério, o valor médio do benefício subiu de R$ 190,75 para R$ 191,86 em março.
Em fevereiro, o novo ministro da Cidadania, Onyx Lorenzoni, anunciou, durante live com o presidente Jair Bolsonaro, o ingresso de novas 185 mil famílias no programa. Segundo o ministério, essas famílias estão na folha de março.
Segundo o ministério, como medida de enfrentamento aos impactos do coronavírus, o governo anunciou um reforço no Bolsa Família, com a inclusão de 1,2 milhão de famílias beneficiadas, que hoje estão na fila de espera.
Cortes aumentam miséria
O doutor em Economia Social e pesquisador do Bolsa Família, Cícero Péricles de Carvalho, diz estar surpreso com a folha de março e com a explicação dada pelo ministério, já que o momento exigiria uma rápida ação para aumentar a renda das famílias pobres.
“Impressiona que, num momento em que todos os países afetados pela epidemia estão ampliando suas políticas sociais como forma de enfrentar os impactos da crise nos setores mais pobres da população, o governo brasileiro reduza a cobertura no seu mais eficiente programa
de combate à pobreza”, opina.
Ele critica o fato de a maioria dos cortes ocorrer justamente no Nordeste. “A região tem apenas 27% da população brasileira, e teve 60% dos cortes. É um contrassenso”, avalia.
Sobre a justificativa do ministério de emancipação de 330 mil famílias, Carvalho contesta. “A redução da cobertura não combina em nada com o momento em que vive o país, com aumento da informalidade no mercado de trabalho e crescimento do número de pobres, como informa
o IBGE, na Síntese de Indicadores Sociais”, explica.
Voucher de R$ 200 aos trabalhadores informais
O pesquisador cita que o “voucher” de R$ 200 prometido pelo Ministério da Economia aos trabalhadores informais durante três meses é positivo, “mas insuficiente, restrito e de difícil implementação”.
“É a ‘invenção da roda’, levando-se em conta que o Ministério da Cidadania já possui o cadastro de todas as famílias de baixa renda e experiência para realizar programas nessa área. Basta o governo, em vez de cortar benefícios, atender a demanda legal de 2,4
milhões de famílias na extrema pobreza, que têm direito e não estão incluídas no Bolsa Família; e, de forma concomitante, agilizar a concessão dos benefícios previdenciários dos 2,2 milhões de pedidos que se encontram encalhados no Ministério da Previdência Social”, sugere.
Se essas medidas fossem adotadas de forma urgente, haveria grande capilaridade, pontua. “O impacto seria de curto prazo, positivo neste momento de diminuição da atividade econômica, aumento do desemprego e queda de renda da população mais pobre”, completa.
Fonte: Carlos Monteiro/UOL