O Brasil atual traz à lembrança um daqueles bailes de salão das noites de sábado, em que a música muda ao sabor do humor dos convidados. No palco da política nacional, o ritmo raramente é constante e nunca segue a mesma partitura. Dizem que a política é a arte do possível; por aqui, ela se tornou a arte do “conforme a conveniência”, para não dizer interesses de todos os tipos, imagináveis e inimagináveis, essa é a mais pura verdade, pois assim eles se comportam.
A cada semana surge um novo compasso. Quando o governo tenta conduzir a orquestra, alguma bancada decide puxar o país para outro lado. Quando o Congresso esboça um avanço, corporações organizadas recuam o passo coletivo. E quando, por acaso, parece haver coordenação, eis que surgem caciques que entram em cena com passos calculados, deslocando o eixo inteiro da dança. Isso sem contar as viradas de ritmo determinadas por decisões monocráticas do STF, que muitas vezes definem o tom da noite sem consultar ninguém da plateia.
Enquanto isso, o contribuinte – que banca a festa – observa de longe, porque raramente é convidado para o salão principal. Do seu olhar à distância, vê apenas vultos, escuta trechos de acordes e tenta entender qual coreografia está valendo naquele dia. Na maior parte do tempo, não entende. E não porque lhe falte interesse, mas porque o baile não foi organizado para ser compreendido: foi montado para ser manipulado, e só tocar aquela música cuja letra diz mais ou menos assim: “toma lá/dá cá/e se não der/não vai levar…”
Dentro do salão, dançarinos profissionais – parlamentares, lobistas, dirigentes partidários – não se movem por vocação ou harmonia, mas por cálculo. Cada passo é medido: um erro pode custar influência; um acerto oportuno pode render aplausos, verbas, cargos e a promessa de mais uma temporada na pista chamada reeleição. O que funciona mesmo é a boa estratégia, através da fala mansa de alguns, que se tornaram especialistas na arte de enganar até a si mesmos!
E é justamente esse cálculo que mantém o país girando em falso. Enquanto o Brasil tenta encontrar um ritmo minimamente estável para avançar, a elite política segue dançando conforme a música que ela mesma compõe – uma música dissonante, instável e sempre afinada pelos interesses de poucos, não pelo futuro de muitos.
Nesse espaço da diversão, há também um cantinho que nunca recebe luz: o espaço onde os acordos são malandramente sussurrados, onde as promessas são embaladas entre as taças de cristal e onde decisões que mudam destinos inteiros são tomadas sem que uma única palavra alcance o público lá fora. Ali, por um instante, não há dança – há coreografia subterrânea. Os figurões deslizam como se estivessem invisíveis, pactuando interesses escusos que jamais serão publicados nos diários oficiais, mas que determinam, com precisão cirúrgica, o rumo do país. E o povo? Este nem sequer sabe que existe uma dança oculta por trás da cortina!
Fora do salão forma-se uma fila longa, silenciosa, quase resignada. São trabalhadores, estudantes, aposentados, gente que acorda cedo e dorme tarde tentando sobreviver a um país que sempre parece funcionar para outro público.
Não é a política que falhou com o Brasil e sim os seus dançarinos que se acostumaram a circular apenas ao redor dos próprios privilégios. E enquanto o povo permanece do lado de fora, pagando por um baile do qual nunca participa, os donos do salão seguem trocando a música como quem troca de roupa
A verdade, insofismável, é esta: não falta talento ao país; falta decência a quem o dirige. Essa metáfora reproduz a imagem de um Brasil entregue a uma coreografia cínica. Seguiremos assistindo o mesmo baile velho, repetitivo e vergonhoso, onde todos os lordes dançam, menos a grande massa de brasileiros. Onde eles dão pão e circo para a massa, e vão se banquetear, e até mesmo sorrir da cara de um povo batalhador e guerreiro.
Autor: Adm. Agenor Santos, Pós-Graduação Lato Sensu em Controle, Monitoramento e Avaliação no Setor Público – Salvador – BA.
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